Ao contrário do que dizem os críticos do Bolsa Família, como políticos que chamaram de “bolsa esmola”, o programa criado no governo do ex-presidente Lula estimulou a população mais pobre a lutar por oportunidades nunca antes imaginadas, como é o caso dos jovens talentos que vivem na pobreza ou na miséria e que o programa ajudou a revelar.
Uma pesquisa do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) identificou o aumento de beneficiários do Bolsa Família entre os ganhadores de medalhas na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (Obmep). Mais de 2.717 jovens inscritos no Cadastro Único (que dá acesso a programas como o Minha Casa Minha Vida e Erradicação do Trabalho Infantil – Peti) foram premiados com ouro, prata e bronze nos últimos sete anos.
Do total, 999 são beneficiários do Bolsa Família. Eles conquistaram 1.288 medalhas, uma média de 184 por ano, sendo 93 de ouro, 234 de prata e 961 de bronze, além de 465 menções honrosas.
O deputado federal Patrus Ananias (PT-MG), ex-ministro do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome no governo Lula, diz que a pesquisa comprova a consistência do programa não apenas no combate à fome, à miséria e à desigualdade, mas também na geração de renda para os mais pobres, no desenvolvimento das economias locais e nacional, e no acesso das famílias à educação e à saúde.
“Quando você exige do beneficiário a contrapartida do comparecimento à escola e ao posto de saúde, é uma forma de forçar o Estado a garantir essas políticas públicas e proporcionar oportunidades a esses jovens”, explica Patrus.
De acordo com a pesquisa do MSD, há medalhistas de todos os estados brasileiros. O Nordeste, que recebeu pesados investimentos durante os governos Lula e Dilma, depois de décadas e décadas de abandono, é a Região com o maior número de medalhas (126). Na sequência, vem o Sudeste, com 118 medalhas. Entre os vencedores há, ainda, sete jovens com deficiência, dois indígenas e um quilombola.
Destinos transformados
Entre os campeões está o goiano Luiz Vasconcelos Júnior, seis vezes medalhista na Obmep e duas vezes na Olimpíada de Física. Seu desempenho chamou a atenção de uma escola carioca especializada em preparar os alunos para o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e o Instituto Militar de Engenharia (IME).
Apesar da frágil situação financeira da família – os pais estão desempregados e a renda vem da venda de salgados, dos bicos de pedreiro do pai e do benefício do Bolsa Família -, o futuro do jovem Luiz tende a ser promissor. Desde fevereiro deste ano, ele deixou a mãe, o pai e o irmão mais novo no interior de Goiás para morar no alojamento da escola na capital fluminense com todas as despesas básicas cobertas pela bolsa que recebe (mensalidade, transporte, alimentação e alojamento).
Com a oportunidade, Luiz passou a estudar em tempo integral e aumentou as chances de alcançar o sonho de estudar engenharia aeronáutica em uma das instituições mais conceituadas do País.
Outro campeão com várias medalhas no currículo e que mudou a história de sua família é o alagoano Maxmilian Barros de Siqueira. Aos 17 anos, cursa graduação em matemática na Universidade Federal de Alagoas (Ufal) ao mesmo tempo em que é bolsista do programa de iniciação científica. Primeiro da família de cinco filhos a chegar à universidade, Maxmilian conta que a renda da casa onde mora depende, basicamente, do Bolsa Família. Apesar de não faltar nada, eles vivem sempre perto do limite.
Segundo a sua mãe, Gilvaneide Barros, o Bolsa Família ajuda muito, pois a única renda que eles têm é a pensão pela morte do marido, um ex-policial militar. “Uso o dinheiro do Bolsa para comprar o material escolar deles”, contou a mãe em entrevista à equipe que fez o estudo pelo MDS.
A fala de Gilvaneide dialoga com as pesquisas feitas pelo governo à época em que o deputado Patrus Ananias comandava a pasta responsável pelo programa Bolsa Família. Segundo o parlamentar, os estudos constataram que os benefícios recebidos pelas famílias eram gastos com alimentação em primeiro lugar e material escolar em segundo.
“E esse é um dado muito importante, pois mostra como as famílias estavam entendendo e priorizando a garantia e permanência dos filhos nas escolas”, ressalta.
O sucesso do Bolsa Família se deve a integração do programa a outras políticas que garantem às famílias serviços básicos e qualidade de vida para que as crianças e jovens possam permanecer estudando, como os programas de combate à fome e ao trabalho infantil, o programa Luz para Todos, que levou luz à casa de milhões de brasileiros que antes viviam na escuridão, além das políticas ligadas à Assistência Social, explica Patrus.
“Todos esses investimentos e programas permitiram com que os jovens e crianças passassem a permanecer na escola, pois as famílias tinham mais condições de garantir isso”, diz.
No entanto, alerta o parlamentar, a Emenda Constitucional 95, que congela os investimentos públicos por 20 anos, “assinou a sentença de morte do programa.”
“São 20 anos sem investir, o que é muito grave e quebra a sequência de crescimento, distribuição de renda e combate à fome e à miséria que vínhamos garantindo com os investimentos no programa.”
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnadc) mostram que cerca de 330 domicílios deixaram de receber os benefícios do programa, caindo de 14,3% em 2016 para 13,7% em 2017.
Como a média de pessoas nos lares que recebem a ajuda do governo é de 4,8 moradores, o total de pessoas que ficaram sem receber o Bolsa Família chega a 1,5 milhão. O Nordeste concentrou o número de famílias que perdeu o benefício. Foram menos 130 mil domicílios na região, 40% do total.
O dilema entra trabalhar ou estudar
A situação de vulnerabilidade social e financeira de muitas famílias é um dos principais fatores que impede muitos jovens a dar continuidade ao estudo. Em muitos casos, a única opção é abandonar o sonho de um promissor futuro universitário para trabalhar e ajudar na renda de casa.
É a história do hexacampeão da Olimpíada de Matemática, Rodrigo Gonçalves do Nascimento. Aos 19 anos, com seis medalhas no currículo, ele luta para não ter de viver a experiência de abandonar os estudos.
Morador de Capela do Alto, no interior de São Paulo, Rodrigo tenta desde 2016, quando terminou o ensino médio, conciliar a necessidade de trabalhar com o esforço de estudar para passar no Enem e iniciar a tão sonhada graduação em Engenharia Mecânica na Universidade Federal de São Carlos (Ufscar).
Para ajudar na renda da casa, ele já passou por quatro empregos diferentes. No último, trabalhava sem carteira assinada cerca de 12 horas por dia, inclusive aos finais de semana, com direito a apenas uma folga.
“Eu tive de parar tudo para trabalhar, mas eu quero ser alguém. Minha família inteira não tem faculdade, minha mãe trabalhou sempre com faxina, meu pai é caseiro e ganha muito pouco”, disse Rodrigo à equipe que fez o estudo pelo MDS.
Neste ano, Rodrigo deixou o emprego para se dedicar integralmente à prova do Enem. Ele agora ajuda em casa vendendo doces e consertando computador, além de contar com o auxílio da mãe, Iolanda Borba, e do padrasto, Agnaldo da Silva, que vendem salgados e fazem faxina para ajudar na renda.
O valor recebido pelo programa Bolsa Família é o que também tem ajudado a pagar as contas. A família ainda tem direito ao benefício por causa do filho mais novo, o Ryan, de 16 anos. “O Bolsa Família me ajudou muito. Uso para comida, para a conta de água e luz”, conta Iolanda.
O Bolsa Família e as contrapartidas
Para receber o Bolsa Família, as famílias de baixa renda assumem o compromisso de garantir o acompanhamento nutricional e a vacinação para as crianças de até sete anos de idade. Além disso, as gestantes precisam fazer o exame pré-natal e o acompanhamento da sua saúde e do bebê para ter acesso ao benefício.
Na educação, todas as crianças e adolescentes entre seis e 15 anos devem estar devidamente matriculados e com frequência escolar mensal mínima de 85% da carga horária. Já os estudantes entre 16 e 17 anos devem ter frequência de, no mínimo, 75%.
> Acesse aqui a íntegra do estudo do MDS
Fonte: Tatiana Melim – CUT Nacional