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Seminário da CUT-RS e centrais denuncia impactos nefastos da MP 905 para os trabalhadores
Os impactos nefastos da Medida Provisória (MP) nº 905/2019, que cria o Programa Verde e Amarelo do governo Bolsonaro, foram denunciados no seminário realizado na manhã desta sexta-feira (6), no auditório do Foro Trabalhista, em Porto Alegre. O evento foi promovido pelas centrais sindicais (CUT, CTB, CGTB, NCST, FS, CSP/Conlutas, Intersindical, CSB e Pública) em parceria com entidades representativas do judiciário (OAB/RS, MPT/PRT-4, Agetra, Agrat, AJD, Amatra e CNAPS).
Após a abertura feita pela desembargadora e futura presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4), Carmen Gonzalez, com posse marcada para o próximo dia 13, foram realizadas duas meses de debates com exposições de magistrados, advogados, procuradores do Trabalho e especialistas.
Eles apontaram os efeitos perversos da MP 905, editada em 11 de novembro pelo governo, que já está em vigência, com validade de 60 dias, podendo ser prorrogada por mais 60 dias, sem contar o recesso parlamentar. A medida só terá continuidade após o final do prazo se for votada e aprovada pelo Congresso.
Nova reforma trabalhista
A MP 905 piora mais de 86 itens da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). É uma nova reforma trabalhista, na medida em que retira vários direitos, reduz salários, desregulamenta profissões, precariza o trabalho, dificulta ainda mais o acesso à Justiça do Trabalho e acaba com o descanso do trabalhador e da trabalhadora aos domingos e com o direito à indenização por acidente no trajeto para o trabalho.
Uma das principais maldades é a criação da carteira verde e amarela, que servirá para contratação de jovens entre 18 e 29 anos, que receberão até um salário mínimo e meio ou R$ 1.497 pelo prazo de até dois anos. As empresas serão isentas de recolher 20% do salário para o INSS e poderão reduzir de 8% para 2% o depósito no FGTS. Em caso de demissão sem justa causa, a multa sobre o saldo do Fundo de Garantia terá ainda redução de 40% para 20%.
Derrotar o governo Bolsonaro
A secretária-geral da CUT-RS, Vitalina Gonçalves, alertou para a necessidade da luta. “Se esse governo fez o que fez com 11 meses, o que ele fará em 3 anos? Não restará pedra sobre pedra se nós permitirmos. É preciso derrotar o governo Bolsonaro, que pretende acelerar os processos de supressão dos direitos sociais do povo brasileiro. Portanto, cabe a nós a unidade”, defendeu.
A presidente da Associação Juízes pela Democracia, Valdete Souto Severo destacou as inconstitucionalidades presentes na MP 905 e chamou os magistrados e profissionais do Direito a não aceitarem o retrocesso.
“Nossa função aqui hoje não é apenas dizer o quão perverso e fascista esse governo consegue ser. A nossa função é descobrir o que nós vamos fazer em relação a isso. Não podemos compactuar com o desmonte do Direito do Trabalho. Meu convite é que nós radicalizemos em defesa de uma Justiça do Trabalho que efetivamente se comprometa com os direitos”, salientou Valdete.
Abrir os bancos aos sábados vai mudar pagamento de contas
A presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 4ª Região (Amatra IV), Carolina Gralha, destacou os pontos mais perversos da MP 905. Um deles atinge os bancários, uma vez que os bancos poderão abrir aos sábados. Isso, porém, afetará também a sociedade.
“As pessoas não percebem como a revogação de algumas leis podem impactá-las. Não é só a agência que vai ficar aberta. Significa que a conta com vencimento para o sábado vai compensar naquele dia mesmo e não apenas na segunda-feira. É uma medida que ao fim e ao cabo só favorece ao mercado financeiro”, alertou a juíza.
Gralha lembrou também os dois anos da aprovação da reforma trabalhista do golpista Michel Temer, que não gerou os empregos prometidos e intensificou a desigualdade social, a informalidade e a insegurança jurídica de trabalhadores das mais diversas categorias. “A reforma foi vendida como a única solução para combater o desemprego. Não é preciso muito esforço para percebermos que ela não cumpriu sua promessa”, afirmou.
Ela denunciou que 58% das reclamatórias trabalhistas ajuizadas pelos trabalhadores se referem ao não pagamento de verbas rescisórias. “É a lei trabalhista mais básica e, ainda assim, não é respeitada”, lamentou a magistrada.
Destruição dos direitos sociais e trabalhistas
Representante do Conselho Nacional de Direitos Sociais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Paulo Leal, destacou que o processo de destruição dos direitos sociais e trabalhistas não se resume apenas à MP 905 e nem teve início com ela. “A lei 13.467, mais conhecida como reforma trabalhista, foi aprovada para destruir completamente a legislação social brasileira”, frisou.
“O direito do trabalho tem por finalidade proteger o trabalhador. Se a economia está com algum problema, compete às autoridades econômicas e políticas encontrarem uma solução, mas sempre preservando as garantias constitucionais de quem trabalha”, enfatizou. Ele observou que a MP 905 é mais um experimento social para averiguar como a população se comporta diante da retirada de mais direitos.
O coordenador técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) no Rio Grande do Sul, Ricardo Franzoi, enfatizou que a MP 905 é fruto de um fenômeno que vem sendo cada vez mais comum dentro do mundo do trabalho, que é a financeirização das direções de médias e grandes empresas e multinacionais.
Obtenção de lucros recordes no menor tempo possível.
“Cada vez mais, o que move as empresas é o mercado financeiro e a obtenção de lucros recordes no menor tempo possível. A distribuição de lucros de empresas de capital aberto envolve diretamente a redução de custos da força de trabalho. Então, para que um acionista tenha o rendimento prometido pelo agente do mercado financeiro, os empregadores buscam reduzir o custo de contratação de trabalhadores”, denunciou Franzoi. Ele disse ainda que a MP 905 e a lei chamada de “liberdade econômica” são iniciativas que vão ao encontro dos interesses da especulação financeira.
Também compuseram as mesas de debates o procurador do Ministério Público do Trabalho, Gilson Luiz Azevedo, que falou sobre as limitações às ações de fiscalização do trabalho, e o representante da Associação Gaúcha dos Advogados Trabalhistas (Agetra), Denis Einloft, que criticou as restrições ao acesso da população à Justiça do Trabalho.
Houve também espaço para manifestações de dirigentes das centrais e profissionais do mundo do trabalho, que não pouparam críticas aos ataques do governo aos direitos da classe trabalhadora.
O diretor do Sintrajufe-RS e da CUT-RS, Marcelo Carlini, destacou a importância de servidores e magistrados atentarem para os retrocessos. “Esse é um projeto de destruição das conquistas e dos direitos trabalhistas. Temos uma longa batalha pela frente para derrubar esse projeto, mas está na ordem do dia acabar com esse governo o quanto antes”, ressaltou.
Também participaram os diretores da Executiva da CUT-RS Antonio Güntzel, Paulo Farias, Ademir Wiederkehr e Isis Marques, que igualmente se manifestaram contra os absurdos da MP 905.
Ao final do seminário, foram encaminhadas várias propostas de resistência e enfrentamento à MP 905 e foi lido e aprovado um manifesto das entidades que organizaram o encontro.
Leia a íntegra do documento:
MANIFESTO POR UM BRASIL VERDE E AMARELO DE VERDADE
PELA DEVOLUÇÃO OU REJEIÇÃO DA MP 905
O governo revigora suas investidas contra os Direitos Sociais dos trabalhadores, desta vez por meio da Medida Provisória 905. Na linha do quanto já vem manobrando contra o Sindicalismo, contra a Previdência Social e contra a Justiça do Trabalho, retoma a falsa linha argumentativa de que a redução de direitos poderia gerar novos empregos.
A receita apresentada é a mesma que motivou a edição e promulgação da Lei 13.467/17, conhecida como Reforma Trabalhista, que perpetrou a mais profunda alteração na CLT desde a sua criação, sob a alegação de que, a partir de então, novos postos de trabalho surgiriam naturalmente.
Passados mais de dois anos da vigência da Lei que extinguiu e reduziu inúmeros direitos trabalhistas, afrontou dispositivos constitucionais e dificultou o acesso dos empregados ao Poder Judiciário, o tempo nos mostrou que a promessa não foi cumprida: o número de desempregados continua alarmante.
Agora é editada a MP 905, sob o mesmo discurso, repetido em forma de mantra, de que o trabalhador deverá optar por ter “menos direitos e mais empregos ou todos os direitos e desemprego”.
Ora, nem mesmo o sedizente apelo nacionalista da “Carteira Verde Amarelo” é capaz de esconder as falsas promessas, as inconstitucionalidades e a atecnia peculiar, voltadas para solapar a dignidade do trabalhador e reduzir os patamares civilizatórios da Constituição de 1988.
Num ambiente de precarização, como aquele que a MP 905 aprofunda no campo das relações de trabalho, urge a ação propositiva, com o esclarecimento da sociedade e o reconhecimento da inconstitucionalidade por seus diversos vícios técnicos.
A MP intensifica a exploração da mão de obra com a redução de direitos para os jovens trabalhadores entre 18 e 29 anos, a exemplo da redução da multa e dos depósitos do FGTS, autoriza um regime de trabalho sem pagamento de horas extras, libera o trabalho aos domingos e feriados e ainda, reduz o pagamento de adicional de periculosidade de 30% para 5% e extingue o registro profissional de 13 categorias.
Mitiga a fiscalização do trabalho, essencial para a saúde e segurança do trabalhador, como também, no campo processual, altera o critério de atualização dos créditos trabalhistas em prejuízo do trabalhador que teve seus direitos sonegados. Não passa despercebida a esdruxula taxação do seguro desemprego ou as reduções nas contribuições sociais, colocando ainda mais em xeque as políticas públicas, especialmente o SUS.
Subverte a lógica da negociação coletiva quando impede a alteração de condições precarizantes da própria MP, contradizendo todo o discurso aparente de valorização da negociação coletiva.
O ideário jurídico que permeia a MP 905 traz à luz o intento discriminatório e segregacionista como suposto vetor fundante para o desenvolvimento econômico. A intenção de negar o Estado Social é a ordem primeira do conjunto de outras medidas a que esta MP está inserida.
No aspecto técnico, a MP 905 não somente desconsidera a urgência e relevância para sua edição, como ignora o debate tripartite, a exemplo do que prevê a convenção 144 da OIT, evidenciando o desatino governamental sobre Direitos Sociais e Direito do Trabalho.
Diante disso, a sociedade civil organizada e o conjunto das entidades signatárias do presente MANIFESTO POR UM BRASIL VERDE AMARELO DE VERDADE entendem fundamental a devolução desta Medida Provisória para o executivo ou a sua rejeição integral, ante os enormes retrocessos sociais e vícios técnicos que apresenta, como ordem primeira do Estado Democrático de Direito.