Pelas novas regras de imigração dos Estados Unidos, os adultos que cruzam a fronteira com seus filhos, ilegalmente, são processados criminalmente e levados para presídios federais.
Essas crianças, que por lei não podem permanecer nesses estabelecimentos, são enviadas para abrigos mantidos pelo governo norte americano, no que podemos definir como uma espécie de reedição dos tristemente célebres campos de concentração da Segunda Guerra Mundial.
Em um desses centros de detenção, entre choros e soluços, um guarda ironizou: “temos uma orquestra aqui, só falta o maestro!”
Essa situação terrível foi revelada pelo site de notícias ProPublica, que revelou todo o desespero de crianças separadas de seus pais com base na nova política para imigração implementada pelo governo Trump, em mais uma tentativa de “deter a imigração ilegal”, segundo ele.
“Os Estados Unidos não serão um acampamento de migrantes, nem uma instalação de abrigo de refugiados. Não sob o meu comando”, declarou o presidente republicano.
Trump mencionou também “o que está acontecendo na Europa”, acrescentando que “não pode permitir que isso aconteça” nos EUA.
“Não quero que prendam meu papai, não quero que o deportem”, disse uma das meninas confinadas em um dos campos.
“Posso ir com a minha tia, pelo menos? Tenho o número do telefone dela, minha mamãe virá me pegar quando eu for com ela” suplicou outra, uma menina salvadorenha de apenas seis anos de idade.
A tia dessa menina disse ter sido esse “o momento mais difícil” de sua vida.
“Imagine receber um telefonema de sua sobrinha de seis anos que está chorando e que pede para você buscá-la, prometendo se comportar, pedindo que por favor a tirassem dali, que estava completamente só?”, declarou.
A mãe dessa criança salvadorenha foi detida enquanto cruzava a fronteira, e levada para um centro de detenção em Port Isabel, no Texas, e segundo sua tia, impedida de falar com a própria filha.
Atualmente, segundo dados repassados pelo Senado norte americano, existem 2.342 crianças detidas em centros de detenção com base na lei de imigração executada pelo governo Trump, crianças mantidas enjauladas, separadas de seus pais.
Voltarei um pouco no tempo, mais exatamente três anos.
Em setembro de 2015 uma multidão de imigrantes corria, maltrapilha, através de um imenso campo na Hungria, sendo brutalmente espancada pela polícia húngara, enquanto dezenas de cinegrafistas filmavam a cena, para espanto do mundo.
“Ótima ação! Essas pessoas estão ilegalmente em nossa Europa. São alienígenas. Possuem zero direito garantido pelas nossas constituições. Tudo que elas querem é espalhar caos e terceiro-mundismo pela Europa. Deportemos todos eles: vivos ou mortos” comentou à época alguém na área destinada a comentários daquela matéria, que foi veiculada em um grande portal de notícias.
O que há de comum entre o discurso do anônimo comentarista, um entre centenas de anônimos que ali se manifestaram, e o discurso do mundialmente famoso presidente dos Estados Unidos, Donald Trump?
O ódio.
O ódio é a plataforma de todo discurso sectário e discriminatório, que busca no amparo e acirramento de alguma lei a justificativa para sua existência.
O ódio que é retroalimentado por Donald Trump, que anteriormente já havia perguntado “por que pessoas de países de merda vêm para cá?”, referindo-se aos imigrantes que buscam asilo em seu país.
O ódio faz com que Trump prossiga usando sua metralhadora verbal, seu repertório de declarações racistas e agora, na ação, acirrando mais ainda a já declarada guerra contra, principalmente, imigrantes mexicanos, maioria dos imigrantes que busca nos Estados Unidos a subsistência que não consegue encontrar em sua terra natal.
A força que induziu o comentarista de internet a conclamar que sejam deportadas vivas ou mortas pessoas que jamais lhes fizeram algum mal é a mesma força que faz com que o funcionário responsável pela guarda das crianças no campo de concentração nos EUA ironize o sofrimento delas.
“Temos uma orquestra aqui, só falta o maestro”.
Sim, temos uma orquestra. Uma orquestra de choros e soluços, cujo maestro é Donald Trump.
O ódio é uma força invisível mas que assume cores e assume contornos quando leis contra imigrantes fazem com que crianças sejam separadas de seus pais, que irmãos não possam se abraçar.
Trump não se sensibliza com a imagem de crianças enjauladas, separadas de seus pais, ou com a imagem de imigrantes espancados em alguma planície na Hungria, isso nós sabemos.
O que não sabemos ainda é qual será o próximo capítulo dessa trágica guerra contra os imigrantes, ou mesmo qual será o próximo ato de uma orquestra composta pelo choro e soluços de crianças inocentes.
Diógenes Júnior é assessor sindical, acadêmico em História, ativista político, pelos Direitos Humanos, pai do Fidel. Artigo publicado pelos Jornalistas Livres.
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